sábado, 8 de dezembro de 2012

O jeito "datenesco" de ser


Datenesco: adj. s.m. s.f. (do português midiático Datena). 1.Aquele ou aquela que segue a mesma ideologia que o Datena pregou em seu programa de televisão. 2.Indivíduo portador de senso comum, incapaz de expor pensamentos elaborados e complexos sobre problemas sociais, repetindo sempre os mesmos jargões e frases feitas, que expressam tendências fascistas, preconceituosas e obsessivas por punições e vinganças.


Está fazendo dois anos que decidimos criar o Blog Sociedade Sem Prisões (assim com o nossa página no Facebook) com o objetivo de divulgar um ponto de vista crítico em relação ao sistema prisional e suas funções sociais e políticas em oposição ao discurso hegemônico e central do governo e da mídia, pois estes não se interessam em mostrar diversidades de pensamentos que existe sobre o tema, mas apenas em massificar a opinião pública. Para além das ações que desenvolvemos pontualmente em nossos trabalhos com pessoas presas, egressos do sistema prisional e familiares, tínhamos o objetivo de também contribuir de alguma forma para mudar o imaginário social distorcido que existe a respeito desta realidade. O discurso governamental e a grande mídia insistem em apresentar o “crime” apenas como um fenômeno de origem e causa exclusivamente individual. Diferentemente, apresentamos uma visão da “criminalidade” a partir de uma gênese social, ou seja, mostramos que, para além das escolhas individuais (que claro, estão sempre presentes), há várias outras questões econômicas, sociais e culturais envolvidas na produção do crime e do criminoso. Portanto, não adianta punir ou recuperar “criminosos”, pois o que precisa realmente ser recuperado é a sociedade, para que os problemas sociais indesejados diminuam. Só que não há interesse por parte dos governantes em transformar essa realidade, que os favorece de várias formas, na medida em que obtém ganhos financeiros com a indústria da segurança, obtém votos e usam as prisões apenas para controlar as classes pobres, mas não para colocar seus iguais que também cometem ilegalidades.

Durante esse tempo, descobrimos que o desafio de debater outros pontos de vista é muito maior que imaginávamos, pois há muitas ideias cristalizadas que são difíceis de serem descontruídas, pois já estão sendo induzidas há anos por programas e jornais sensacionalistas além de também serem influenciadas por mensagens sutis enviadas através das relações entre “mocinhos” e “vilões” de novelas. De forma hipócrita e perversa, essa mídia, ao mesmo tempo em que lucra mostrando a violência o tempo todo, diz pretender combate-la e apresenta soluções simplistas, imediatistas e supostamente “milagrosas” para “combater o crime”. Como exemplo, tivemos o caso da artista Daniela Perez, que gerou a Lei de Crimes Hediondos e, consequentemente, foi seguida de um aumento estrondoso da população carcerária no país, sem surtir nenhum efeito na diminuição da violência. Pelo contrário, quanto mais o país encarcera, mais a sensação de insegurança da população aumenta. Isso, por si só, já deveria ser motivo de questionamentos por parte da população a respeito desta “milagrosa solução”  via repressão. Mas infelizmente o ser humano é muito manipulável e, desprovido de meios para se informar mais profundamente sobre os assuntos que lhe interessam, acabam tendo como fonte formadora de opinião apenas os canais da grande mídia pertencentes à elite da sociedade, que só mostram seu ponto de vista sobre os fatos.

O sensacionalismo desses programas, jornais e novelas é o responsável pela exacerbação de uma cultura do medo, que faz com que a população concentre seus reclames na área da segurança e esqueça as reivindicações nas áreas da saúde, educação, moradia, trabalho digno, distribuição de renda e erradicação da pobreza, previstos em nossa Constituição Federal. Ponto para os políticos! Que poderão seguir seus planos sem ter que mexer com os interesses dos grandes empresários capitalistas que lhes financiam.

Dentro desta programação televisiva, se destaca um personagem caricatural, que concentra todas as características indesejáveis para aqueles que querem pensar seriamente sobre o problema da violência e suas possíveis e reais soluções: o Datena. Qual a característica do sensacionalismo reproduzido por ele e os demais que seguem sua onda? Forte apelo emocional, uso de opiniões e expressões pessoais, chulas e exageradas sobre os fatos, apresentação de imagens e casos chocantes, generalização das opiniões, indução dos telespectadores a uma compreensão distorcida dos fatos, atração de audiência através do choque, com chamadas bizarras do tipo “matou e foi jogar bilhar”. É bom destacar que isso não é uma característica individual deste apresentador, mas, sim, faz parte de um processo histórico e social do qual ele é apenas um produto grotesco. Produto e produtor, uma vez que também contribui para continuar disseminando essa forma de interpretação dos fatos que funciona como um verdadeiro desserviço à comunidade, pois não agrega nenhum valor e não contribui para mudanças sociais significativas e resolução dos problemas apresentados a partir de suas raízes.

Enfim, durante esses dois anos da página “Sociedade Sem Prisões”, nós temos que ler todos os dias frases e jargões de “papagaios de telejornal”, que se tornaram incapazes de pensar e construir ideias próprias, novas, autênticas e autônomas, que só conseguem repetir aquilo que lhes foi empurrado através da tela da TV, por uma repetição cotidiana e hipnotizante de frases (equivocadas) como na propaganda “compre Baton, compre Baton, compre Baton” (proibida pelo Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária).

Atenção: Qualquer semelhança identificada entre vocês (ou alguém que conheçam) e as expressões datenescas abaixo, NÃO é mera coincidência.

"Bandido bom é bandido morto."

"Lugar de bandido/vagabundo/criminoso é na cadeia.”

“Se o adolescente pode votar, pode pagar por seus crimes.”

“Direitos Humanos (ou Direito dos Manos) é pra defender bandido.”

“Depois da criação do ECA os pais não podem mais educar seus filhos.”

“Se tem dó de bandido, então leva pra casa.”

“Só eu que fui violentado(a) (ou tive um pai, uma mãe, um avô, um irmão) violentado(a) sei o que é ser vítima desses vagabundos.”

 “Se um criminoso desses estuprasse ou matasse alguém da família desses defensores dos direitos humanos eles mudavam de ideia.”

“Depois que inventou esse tal de direitos humanos a criminalidade piorou.”

“É por causa da impunidade que os ‘menores’ estão matando desse jeito.”

“Um menor mata e estrupa alguém e no outro dia já está na rua. Não tem punição.”

“Esses ‘direitos humanos’ não se preocupam com as vítimas, só com os criminosos.”

“Enquanto o trabalhador só ganha salário mínimo, o bandido tem bolsa de 900 reais, tem comida todo dia, médico, nutricionista, etc.”.

“Direitos humanos foram feitos para humanos direitos.”

“Os criminosos fazem o que fazem porque sabem que não vai dar nada pra eles.”

“A pobreza não justifica o crime porque eu conheço um pobre (ou tenho um parente pobre, ou eu sou um pobre) que mesmo assim conseguiu ‘subir’ na vida, estudar e trabalhar honestamente.”

“Os adolescentes tem que ser punidos como adultos, pois já sabem muito bem discernir entre o certo e o errado.”

“Bandido tinha que ficar a pão e água na cadeia, fazendo trabalhos forçados e apanhando todo dia pra aprender.”

 “Tem que punir os menores porque os traficantes estão usando eles pra fazer todo tipo de maldade porque eles não vão presos.”

“Esses criminosos são psicopatas perigosos e sem empatia e por isso merecem ficar presos pra sempre ou morrer.”

"Esse bando de marginais vagabundos estão soltos nas ruas enquanto os cidadãos de bem estão presos em suas casas."

"Polícia na rua e bandido na cadeia!"

"Pra esse tipo de gente monstruosa sou a favor da pena de morte."

“Vocês que ficam com dó desses vagabundos é que mereciam ser assaltados ou levar um tiro na cara pra aprender.”

Enfim, a lista poderia ser maior. Mas como podem ver, expressam um pensamento único: o clamor pela punição (vingança) e a crença nesta como a única saída para o problema da violência. E são esses pensamentos que formam o que eu tenho chamado de “jeito datenesco de ser”.

P.S. Em outra oportunidade irei comentar porque cada uma dessas frases/ideias está totalmente equivocada.


sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Antes tarde?


Pela primeira vez na história vemos um fato como o do Mensalão, onde estão sendo julgados e condenados à pena de prisão vários membros da elite governamental, os famosos “colarinhos brancos”, que sempre passaram impunes pelo sistema penal.

As mazelas do sistema prisional, por sua vez, já são um assunto velho para nós que convivemos diretamente com essa realidade. Entretanto, agora se tornaram pauta dos ministros do Supremo Tribunal Federal, dos quais eu ainda não tinha ouvido sequer um pronunciamento significativo sobre o assunto.

Agora que seus pares estão indo para a prisão, eles se interessaram, subitamente, por falar nas más condições do sistema prisional; na falta de critérios nas aplicações das penas; no cerceamento da liberdade como um modelo esgotado e cada vez mais questionado; em presos passando fome no Pará... Enfim, passaram a questionar até mesmo a filosofia da punição daquele que comete um delito, apontando que tal fato, agora, está em debate na sociedade brasileira, que não é pedagógico colocar pessoas na cadeia, mas sim recuperar valores desviados e que as penas restritivas de liberdade combinam com o período medieval e não com o momento atual. Ao que parece, a condenação dos ricos e poderosos nos levou para o futuro? Um futuro onde se percebeu o quão é primitivo encarcerar seres humanos?

Resta-nos saber até quando irá durar esse “futuro” onde as prisões são consideradas medievais. Talvez até conseguirem substituir as penas privativas de liberdade dos colarinhos brancos para prisões domiciliares ou penas pecuniárias. E aí iremos de volta para o passado medieval novamente, onde só os pobres "merecem" ficar.

A despeito das lesões financeiras causadas pelos réus do mensalão se tratarem de lesões ao patrimônio público, violando assim o direito da população que sofre com as carências de recursos na saúde, educação, moradia, entre outros, eles estão reivindicando que nesses casos deveriam ser aplicadas penas pecuniárias (multas), alegando se tratar de lesões estritamente financeiras. Ok. Concordo que a prisão não é a solução para a corrupção do país, que continua a mil, paralelamente a estes julgamentos de alguns bodes expiatórios. Mas se aplicar pena pecuniária e multa aos ladrões do colarinho branco, eles DEVEM criar jurisprudência para aplicar o mesmo critério aos ladrões das classes pobres e expedir o alvará de soltura de todos que estão em nossos porões fétidos neste momento, substituindo suas penas devido a furtos e roubos, igualmente, por prestações pecuniárias.


PS. Reflexão feita a partir da leitura da seguinte notícia: 

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Pós-Graduação ‘Lato Sensu’ em Direitos Humanos

O Instituto DH: Promoção, Pesquisa e Intervenção em Direitos Humanos e Cidadania em parceria com o Instituto Santo Tomás de Aquino - ISTA oferece aos profissionais do terceiro setor, técnicos do setor público e graduados em qualquer área de conhecimento o curso Pós-Graduação ‘Lato Sensu’ em Direitos Humanos

Para mais informações, acesse o blog do curso:http://especializacaoidh.blogspot.com.br/


terça-feira, 3 de julho de 2012

Por uma sociedade livre do mercado - Pepe Mujica

Pepe Mujica, presidente do Uruguai, tem chamado a atenção com sua forma irreverente de administrar o Estado. Entre as notícias mais populares sobre ele, estão aquelas que falam sobre a doação que ele faz de 90% do seu salário para programas de habitação; sobre ele ser o presidente mais pobre do mundo, levando uma vida simples em uma chácara com o salário de U$1250 por mês e um Fusca 1987; sobre o fato de ter cedido o palácio do governo para servir de abrigo para sem teto durante o inverno caso faltem vagas; além de sua história como militante tupamaro, que lhe rendeu 14 anos de prisão durante a ditadura militar em seu país.

Abaixo a tradução de sua preciosa intervenção durante a Rio +20: 

"Vimos expressar nossa vontade mais íntima como governantes e acompanhar todos os acordos que nossa pobre humanidade poderá se inscrever. Não obstante, nos permita fazer algumas perguntas em voz alta. Durante toda a tarde estávamos falando sobre desenvolvimento sustentável. Sobre o resgate das imensas massas da pobreza. O que é isso que vibra em nossas mentes? O modelo de desenvolvimento e consumo reinante nas sociedades ricas? Me faço a pergunta: o que aconteceria com este planeta se o povo da Índia tiver o mesmo número de carros por família que os alemães tem? Quanto de oxigênio nos sobraria para poder respirar? Mais claramente: o mundo hoje tem os elementos materiais para permitir que sete, oito bilhões de pessoas possam ter o mesmo nível de consumo e esbanjamento que tem as sociedades mais opulentas do ocidente? Será possível? Ou teremos que começar outro tipo de discussão? Porque nós criamos uma civilização que é filha do mercado e filha da competição, que tem gerado um progresso material prodigioso e explosivo. A economia de mercado criou uma sociedade de mercado e nos deu essa globalização, que significa olhar para todo o planeta. Estamos governando a globalização ou a globalização nos governa? É possível falar de solidariedade e que estamos todos juntos em uma economia baseada na competição impiedosa? Até onde chega nossa fraternidade? Eu não digo isso para negar a importância desse evento. Pelo contrário, o desafio à frente de todos nós é de uma magnitude de caráter colossal e a grande crise não é ecológica, é política. Os homens não governam hoje as forças que ele desencadeou, mas sim essas forças que governam os homens e a vida. Porque não vimos para este planeta apenas para desenvolver, assim indiscriminadamente. Viemos à vida para tentar ser felizes. Porque a vida é curta e se vai. E nada material vale tanto como a vida, isso é elementar. Mas a vida vai me escapar trabalhando e trabalhando para consumir mais. E a sociedade de consumo é o motor, porque se paralisa o consumo, a economia para. E se você parar a economia, o fantasma da estagnação aparece para cada um de nós. Mas é esse hiper-consumo que está agredindo o planeta. E temos que gerar esse hiper-consumo com coisas que durem pouco, pois tem que vender muito. Uma lâmpada não pode durar mais que 1.000 horas. Mas tem lâmpadas elétricas que podem durar 100.000, 200.000 horas. Mas essas não podemos fazer, porque o problema é o mercado, porque termos que trabalhar e ter uma civilização de uso e descarte e estamos em um círculo vicioso. Isto são problemas de caráter político. Que estão nos mostrando a necessidade de começar a lutar por outra cultura. Não se trata de voltar ao homem das cavernas nem ter um monumento do atraso. O que não podemos, indefinidamente, é continuar governados pelo mercado. Pelo contrário, temos que governar o mercado. Por isso eu digo que o problema é de caráter político. É minha humilde maneira de pensar. Porque os pensadores diziam, Epicuro, Sêneca: “Pobre não é o que tem pouco, mas verdadeiramente pobres são os que precisam infinitamente muito e desejam, e desejam, mais e mais”. Essa é uma questão de caráter cultural. Então, saúdo os esforços e acordos que estão sendo feitos. E vou acompanhar como governante, porque sei que algumas coisas que estou dizendo não são fáceis de digerir. Mas temos que perceber que a crise da água e a agressão ao meio ambiente não é uma causa. A causa é o modelo de civilização que nós criamos. E o que teremos que revisar é nossa forma de viver porque eu pertenço a um pequeno país muito bem dotado de recursos naturais para viver. Em meu país tem 3 milhões de habitantes, mas há 13 milhões de vacas, algumas das melhores do mundo. Umas oito ou 10 milhões de ovelhas estupendas. O meu país é exportador de alimentos, laticínios, de carne. É uma planície de baixo-relevo e 90% do seu território é aproveitável. Meus companheiros trabalhadores lutaram muito pelas oito horas de trabalho. Agora estão conseguindo seis horas. Mas o que consegue seis horas consegue dois trabalhos, portanto trabalha mais que antes. Por quê? Porque tem que pagar uma quantidade de parcelas da moto que comprou, e paga a conta, e paga a conta, e quando acordar é um velho reumático como eu e lá se foi sua vida. Eu lhe faço essa pergunta: esse é o destino da vida humana? Essas coisas são muito elementares. O desenvolvimento não pode ir contra a felicidade. Ele tem que ser a favor da felicidade humana, do amor na terra, das relações humanas, de cuidar dos filhos, de ter amigos, de ter o elementar. Precisamente, porque este é o tesouro mais importante que temos. Quando lutamos pelo meio ambiente o primeiro elemento do meio ambiente se chama felicidade humana."

Assista ao vídeo: 




segunda-feira, 21 de maio de 2012

LEAP Brasil: Agentes da Lei Contra a Proibição


"Nenhum dos declarados objetivos da política de drogas – reduzir a incidência de crimes, de dependência de drogas e de seu uso por adolescentes e ao mesmo tempo estancar o fluxo de drogas ilícitas  – foi alcançado. Empreender uma guerra às drogas aumentou enormemente nossos problemas, criando uma política de destruição que se autoperpetua e se expande, mas os governos ainda insistem em prosseguir com essa guerra. Esse cenário é a mais perfeita definição de uma política pública fracassada. Essa loucura precisa cessar!

A missão da LEAP - Law Enforcement Against Prohibition (Agentes da Lei Contra a Proibição) é reduzir os inúmeros e danosos efeitos colaterais resultantes da guerra às drogas e diminuir a incidência de mortes, doenças, crimes e dependência, pondo fim à proibição das drogas.

LEAP advoga a eliminação da política de proibição das drogas e a introdução de uma política alternativa de controle e regulação, incluindo pertinentes regulamentações impositivas de restrições à venda e uso de drogas em razão da idade, da mesma forma que existem restrições em razão da idade ao uso de álcool, tabaco, direção de veículos e outras.

A LEAP é formada por policiais, juízes, promotores, agentes penitenciários, agentes do FBI e da DEA, e outros. A LEAP tem um quadro de 75 porta-vozes e membros em 86 outros países.

A LEAP Brasil conta com alguns juízes e policiais entre seus integrantes, dentre os quais a juíza aposentada Maria Lucia Karam, que faz parte de seu quadro dirigente. A presença de uma organização como a LEAP no Brasil decerto fortalecerá a necessária e urgente mobilização para compreender e pôr fim aos inúmeros danos provocados pela particular guerra às drogas brasileira. Ter a LEAP no Brasil significa ter uma voz clara, apontando, sem subterfúgios, a urgente necessidade da global legalização da produção, do comércio e do consumo de todas as drogas.

Somente a legalização da produção, do comércio e do consumo de todas as drogas porá fim à violência provocada pela proibição, que é especialmente sentida no Brasil. A proibição conduz exatamente à falta de qualquer controle sobre esse mercado, que é entregue a criminalizados agentes que, por agirem na ilegalidade, não estão submetidos a qualquer controle ou regulamentação de suas atividades econômicas. Como demonstrado pela realidade e pela história, o mercado das drogas – seja ele legal ou ilegal – não irá desaparecer. As pessoas – especialmente os adolescentes – continuarão a usar drogas, sejam elas proibidas ou não. As pessoas – especialmente as crianças e adolescentes – estarão mais protegidas com o fim da proibição, tendo mais chances de, quando usarem essas substâncias, o fazerem de um modo menos prejudicial à saúde. Além disso, a legalização reduzirá o trabalho infantil, o que é especialmente importante no Brasil, onde inúmeras crianças e adolescentes estão empregadas no mercado ilícito das drogas, que, funcionando na ilegalidade, evidentemente não se submete às regras que previnem o danoso trabalho precoce.

A legalização da produção, do comércio e do consumo de todas as drogas permitirá que os Estados economizem os recursos atualmente mal empregados na danosa guerra às drogas, proporcionando ainda o aumento das receitas tributárias, com os impostos a serem cobrados das atividades legalizadas. Esses novos recursos poderão ser então empregados em investimentos efetivamente úteis e necessários socialmente: educação, moradia, saúde, criação de empregos, preparação profissional, lazer, cultura.
"

Trechos extraídos do site da LEAP Brasil: http://www.leapbrasil.com.br

sexta-feira, 13 de abril de 2012

O que é Direito

"A lei sempre emana do Estado e permanece ligada à classe dominante, pois o Estado, como sistema de órgãos que regem a sociedade politicamente organizada, fica sob o controle daqueles que comandam o processo econômico, na qualidade de proprietários dos meios de produção. Embora as leis apresentem contradições, que não nos permitem rejeitá-las sem exame, como pura expressão dos interesses daquela classe, também não se pode afirmar, ingênua ou manhosamente, que toda legislação seja Direito autêntico, legítimo e indiscutível. Nesta última alternativa, nós nos deixaríamos embrulhar nos “pacotes” legislativos, ditados pela simples conveniência do poder em exercício. A legislação abrange, sempre, em maior ou menor grau, Direito propriamente dito, reto e correto, e negação do Direito, entortado pelos interesses classísticos e caprichos continuístas do poder estabelecido. A identificação entre Direito e lei pertence, aliás, ao repertório ideológico do Estado, pois na sua posição privilegiada ele desejaria convencer-nos de que cessaram as contradições, que o poder atende ao povo em geral, não havendo Direito a procurar além ou acima das leis. Entretanto, a legislação deve ser examinada criticamente, mesmo num país socialista, pois seria utópico/ilusão imaginar que, socializada a propriedade, estivesse feita a transformação social completa."

sábado, 31 de março de 2012

Vidas arriscadas: o cotidiano dos jovens trabalhadores do tráfico


"Esta pesquisa constitui um estudo dos jovens inscritos no tráfico de drogas na cidade de São Paulo. Jovens que vivem uma realidade na qual a violência permeia quase todas as relações e a morte é uma das conseqüências mais constantes. São a parte perceptível do tráfico, a que exibe toda a violência incrustada em sua economia ilegal, aqueles que são um apêndice, a um tempo indispensável e descartável, nas conexões internacionais da “indústria” do tráfico de drogas, uma das de maior rendimento da atualidade. Pretende-se com este estudo contribuir para descaracterizar como doentias as infrações realizadas por eles, pois a razão delas se encontra em contexto maior. Ao desvelar as máscaras sob as quais a sociedade encobre suas engrenagens, procura-se mostrar os elos do qual fazem parte o comércio de drogas, o movimento do capital e o papel desses jovens."

sábado, 24 de março de 2012

Manicômios, prisões e conventos


"Neste texto de 1961, Goffman analisa o mundo das instituições totais, sejam elas de caráter clínico, prisional ou conventual. O autor centra-se, essencialmente, no caráter de fechamento destas instituições, criando-se, dessa forma, uma barreira entre interior e exterior. No interior das instituições habitam não apenas as equipes dirigentes, mas também os internados, os prisioneiros, os que optam por uma vida solitária. Na passagem de uma vida no exterior para uma vida de confinamento espacial e social, o indivíduo passa por processos de modificação. Em qualquer dos casos, seja a institucionalização forçada ou por sua iniciativa, inicia-se um processo de mortificação do eu pelas concessões de adaptação às novas regras institucionais. O indivíduo é jogado entre a sua personalidade real e a personalidade que para si se produz, não só pela equipe dirigente como por toda a sociedade. Goffman analisa ainda a questão do tempo vivido no interior da instituição, nomeadamente a organização do tempo dos internados ou prisioneiros, segundo atividades programadas milimetricamente, cuja função, para além de disciplinar os sujeitos, os inibe em termos de desenvolvimento pessoal."

Estigma


“Este livro reexamina os conceitos de estigma e identidade social, o alinhamento grupal e a identidade pessoal, o controle da informação, os 'desvios' e o comportamento 'desviante', detendo-se em todos os aspectos da situação da pessoa estigmatizada - dos boêmios aos delinqüentes, das prostitutas aos músicos de jazz, dos ciganos aos malandros de praia, do mendigo a quantos são considerados 'engajados numa espécie de negação coletiva da ordem social', os que integram a 'comunidade dos estigmatizados', todos têm, neste livro, sua imagem humanamente explicada à luz da antropologia social. Segundo Goffman o termo “estigma”, de origem grega, inicialmente se referia a um sinal corporal utilizado para evidenciar algo sobre o status moral de seu portador: se tratava de escravo, criminoso ou traidor, por exemplo. Atualmente, refere-se às categorizações criadas a partir de pré-concepções e expectativas que formam uma espécie de 'identidade social virtual' para o indivíduo em detrimento de sua 'identidade real', gerando descrédito e depreciação, 'reduzindo-o a uma pessoa estragada e diminuída.' "

Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro

"O que significa "direito penal"? Qual o mecanismo lógico-jurídico da construção de uma norma penal? O que são a criminologia e a política criminal? Como a realidade do sistema penal, contradiz este próprio direito? Que missão cumpre o direito penal numa sociedade dividida em classes? Quais os princípios básicos do direito penal? Como tais princípios foram produzidos historicamente, e que funções desempenham hoje? Quais os horizontes da ciência do direito penal para libertar-se das peias do tecnicismo jurídico? Essas e outras indagações integram uma unidade curricular decisiva no ensino jurídico: a iniciação ao direito penal." 

sexta-feira, 23 de março de 2012

Anarquismos & Educação


“Este livro destina-se a todos aqueles que pretendem compreender a relação entre o anseio da liberdade e a obediência, muitas vezes reforçada por uma educação e uma escola que não ensinam a pensar e a formar seres críticos. Atentos à riqueza dessa relação, Edson Passetti e Acácio Augusto produziram esta obra que contextualiza os anarquismos e suas manifestações mais lembradas de séculos passados e analisa na atualidade traços dessa postura, registros da anarquia. “Na atual sociedade de controle, o inventor de liberdades atualiza a educação anarquista como espaço de experimentação que sacode o imobilismo, subvertendo a docilidade, a disciplina e a obediência escolares.” Assim pensam os autores, que oferecem ao leitor um interessante e proveitoso estudo que aproxima a educação de elementos inerentes à construção da história, à experimentação da vida livre.”

quinta-feira, 22 de março de 2012

O significado ideológico do sistema punitivo brasileiro


Nas últimas décadas erigiu-se o Direito Penal à categoria de solucionador de todos os males sociais. A pena de detenção é aplicada para delitos de grande e pequeno potencial ofensivo. No entanto, a falência da aplicação genérica da pena privativa da liberdade é notória e o sistema punitivo brasileiro anda na contramão da história. Esse sistema é parte integrante de um sistema geral de justiça que guarda profundas vinculações com estruturas da sociedade internacional. No Brasil, esse processo assume feição ainda mais cruel em virtude de nosso passado de sociedade colonizada e escravista. O projeto de colonização de nossa terra forjou uma sociedade marcadamente desigual, construindo uma pobreza marginal estigmatizada e criminalizada. É através da ideologia que esta realidade é encoberta, impedindo que dominados se revoltem e fazendo com que aceitem como natural e irreversível o modo como as relações sociais se processam. A Criminologia Crítica mediante uma séria análise dos custos sociais da pena busca uma práxis jurídico-política de maior representação legal e processual que assegure os reais interesses coletivos.

quarta-feira, 21 de março de 2012

Uma razoável quantidade de crime

"O mais recente volume da coleção Pensamento Criminológico é a obra da maturidade de Nils Christie, criminólogo cuja produção intelectual, como se sabe, é marcada pela visão crítica e global dos sistemas penais.  Ante o espantoso aumento do número de presos observável na absoluta maioria dos países ocidentais, o autor procura mostrar, através de exemplos eloquentes, que há modelos alternativos de solução de conflitos, cujos índices de eficiência superariam em muito o fracassado modelo penal. Ao mesmo tempo em que reafirma  os equívocos do paradigma etiológico – o crime não é, ele se torna –, Nils deixa clara sua opção pelo minimalismo, isto é, aceita um mínimo de pena somente naquelas hipóteses absolutamente excepcionais em que sua ausência produzirá mais dano do que sua aplicação. O presente livro demonstra, de forma clara, que o sistema penal de determinado lugar é o retrato fiel do tipo de sociedade em que ele atua."

As prisões da miséria


"O livro apresenta o projeto de classe realizado no neoliberalismo: o enfraquecimento do Estado Social e endurecimento do Estado Penal, com a adoção da política de “tolerância zero”, caracterizada pela firmeza na punição de pequenos atos. Curiosamente não se aplica tolerância zero às violações do direito do trabalho pelos patrões ou dos direitos sociais. Neste contexto, a marginalização social, consequência das políticas neoliberais, recebe um tratamento punitivo, e culminando no atual encarceramento em massa que superlotou o sistema prisional, chamado por Wacquant de “máquina varredora de precariedade”. O autor denuncia a política de criminalização da miséria como complemento indispensável da imposição do trabalho assalariado precário e sub-remunerado e como responsável pelo atual “suculento mercado da punição”, hoje em dia indispensável para a economia mundial. Através de pesquisas, o autor também mostra como as taxas de encarceramento não guardam proporções com as taxas de criminalidade, mas, sim, com política criminal adotada pelo Estado e a desigualdade econômica."

sexta-feira, 16 de março de 2012

Um pé de que? Cannabis

Sabemos que na história da humanidade sempre houve o uso de substâncias psicoativas para fins ritualísticos ou medicinais. Sua criminalização, no entanto, só se deu a partir do início do século XX, intimamente relacionada à perseguição de determinados grupos e minorias étnicas através da repressão de suas práticas. No caso do Brasil, por exemplo, da mesma forma que reprimiram o candomblé, a capoeira e o samba, também reprimiram o “fumo d’Angola”, como era chamada a Cannabis (maconha), fumada pelos escravos nos canaviais e antes cultivada e utilizada pelos próprios colonizadores. Só que o conteúdo moral, religioso e político envolvido em sua proibição fez com que esta repressão tomasse proporções enormes culminando no imaginário moralizador e demonizador atual ao seu respeito.

É sobre esta história da criminalização da maconha que discorr o vídeo "Um pé de que? Cannabis" apresentado por Regina Casé no Canal Futura.

Parte 1


Parte 2


Parte 3